Texto escrito por: André Ricardo de Souza

 

A Carta Brasileira pela Economia de Francisco e Clara é um belo documento oriundo de ampla mobilização coletiva. Sua primeira versão surgiu em 19 de novembro de 2019 no Encontro Nacional no Teatro de Arena da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, tendo recebido acréscimos de modo a vir a lume em janeiro seguinte.

 

É parte fundamental da resposta do Brasil ao chamado do Papa Francisco para um encontro mundial de jovens de até 35 anos com sérios intelectuais e ativistas por um mundo mais equilibrado em Assis, Itália, virtualmente,  entre 19 e 21 de novembro de 2020 e, presencialmente, no segundo semestre de 2021 (se as condições sanitárias permitirem), tendo como propósito, segundo ele, “realmar a economia”, apontando o caminho da transição para a um novo paradigma socioeconômico.

 

Na Carta é expresso o compromisso com as gerações futuras pelo cuidado à Casa Comum, origem grega da palavra ‘economia’, dado que o tempo para reverter o aquecimento global está se exaurindo e o planeta tem recursos esgotáveis, não suportando sua exploração infinita. Defende que os combustíveis fósseis permaneçam no subsolo, reduzindo a extração até serem plenamente substituídos mediante o estabelecimento de um novo padrão energético assentado em energias limpas e renováveis.

 

Trata-se de uma proposta na qual feminino e masculino caminham necessariamente lado a lado, sem primazia, daí: Francisco e Clara. Rejeita, portanto, a perspectiva patriarcal ligada à economia marcadamente materialista, produtivista e extrativista. Busca a passagem do egoísmo à generosidade, da exploração à sustentabilidade e da acumulação à distribuição. Tal economia nova não subestima a importância dos bens materiais, mas rejeita o culto à materialidade, expressa no consumismo e no grande armazenamento predial-privado de utensílios não usados.

 

Essa economia contempla a espiritualidade, que é algo não exclusivo das religiões, como reconhecem as ciências médicas junto com a Organização Mundial da Saúde. E, conforme o exemplo de Francisco de Assis, tem perspectiva realmente inter-religiosa, além da opção preferencial pelos pobres.

 

Preconizando princípios éticos e o real equilíbrio entre Estado e mercado, a Carta contém propostas concretas em perspectiva mais ampla: taxação específica sobre o fluxo financeiro em paraísos fiscais, bem como sobre lucros e dividendos, grandes fortunas, artigos luxuosos e prejudiciais à saúde; estabelecimento de medidas para um mundo sem megafortunas individuais e para a eliminação do capital improdutivo e especulativo; reformulação legislativa do sistema financeiro nacional tal como ele existe hoje de modo a facilitar a formação de cooperativas de crédito e bancos comunitários que fazem uso de moedas sociais; disseminação de projetos de Orçamento Participativo nos quais cidadãos são chamados a deliberar sobre a destinação dos recursos coletivos e públicos de comunidades, instituições, cidades, unidades federativas e até países; políticas de crédito facilitado a empreendimentos econômicos autogestionários, rurais e urbanos, também oriundos de processos falimentares, em que todos envolvidos sejam proprietários e trabalhadores, adoção em lei e governamental da Renda Básica da Cidadania, com base na experiência do programa Bolsa Família; implementação do serviço civil nacional, algo eticamente superior ao serviço militar obrigatório; valorização efetiva de saberes ancestrais e da diversidade cultural; desenvolvimento da experiência do Programa de Aquisição de Alimentos a partir de agroecologia e agricultura familiar com estímulo à produção de alimentos saudáveis, sobretudo para merendas escolares; ampliação da rede de Farmácias-vivas, que elaboram remédios de baixo custo para distribuição subsidiada ou gratuita, a partir de plantas medicinais; mudança condizente no currículo dos cursos de economia; e, em detrimento dos frios números do Produto Interno Bruto, dar primazia aos índices de Felicidade Interna Bruta.

Este artigo é uma compilação dos principais pontos abordados pela carta brasileira pela economia de Francisco e Clara. Para acessar a carta na íntegra clique aqui.